Cá estou eu, cabeça entre as mãos, olhos pra além da janela do quarto, que está impossível de alojar um terceiro elemento porque eu e minha solidão já ocupamos todo o espaço vazio.
Os carros se movem por essas linhas cinza-escuro pintadas entre caixotes cheios de janelas e portinhas. Tudo é diferente daqui de cima do meu décimo andar.
As pessoas parecem mais amenas e um tanto menos emotivas, menos humanas até.
As luzes tremulam na água e os barcos quase não se consegue mais ver. A praia sumiu.
Meu horizonte ficou menor, não sei se pela hora avançada do relógio e pelas lâmpadas quebradas dos postes, ou se pela minha visão que está limitada a ver só uma grande montanha à minha frente.
Negra, alta, parece parar o tempo e os olhares.
Do lado de cá do vidro da janela estou eu, me perguntando se depois dessa montanha está minha casa.
Aqui é meu lar, lá é meu lar. Essa pedra está no meio.
Talvez se eu subir em cima da pedra mais alta eu veja a outra metade da minha casa.
To pensando em me jogar.
Ter uma pedra tão alta no meio da sala não dá, minha mãe já o diz, vai ficar difícil da gente se ver.
Mães sempre tem razão, eu já devia saber disso, desde a época que passei frio porque não levei um casaco quando saí de casa.
Saí de casa.
E do lado de cá? Tem gente que diz que a festa é bonita e a maré é boa de provar. Realmente, tem maré, e é Maravilhosa.
Mas é meio maravilhosa. Com m minúsculo.
M de saudade.
Fico me perguntando se depois dessa montanha está minha casa.
Minha, com M maiúsculo.